domingo, 29 de junho de 2008

Mais Pessoa

Talvez o FP tenha sido um pouco assim:
Aos olhos dos outros, um homem é poeta se escreveu um bom poema. A seus próprios, só é poeta no momento em que faz a última revisão de um novo poema. Um momento antes, era apenas um poeta em potencial; um momento depois, um homem que parou de escrever poesia, e talvez para sempre."
(W. H. Auden)




O Universo não é uma idéia minha.
A minha idéia do Universo é que é uma idéia minha.
A noite não anoitece pelos meus olhos,
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.
Fora de eu pensar e de haver quaisquer pensamentos
A noite anoitece concretamente
E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso.

Alberto Caeiro


Dica (para visitar): http://www.culturapara.art.br/opoema/fernandopessoa/fernandopessoa.htm

sexta-feira, 27 de junho de 2008

O que é necessário é criar


NAVEGAR É PRECISO


Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:

“Navegar é preciso; viver não é preciso”.

Quero para mim o espírito [d]esta frase,

Transformada a forma para a casar com o que eu sou:

Viver não é necessário, o que é necessário é criar.

Não conto gozar a minha vida, nem em gozá-la penso.

Só quero torná-la grande,

Ainda que para isso tenha que ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo.

Só quero torná-la de toda a humanidade;

Ainda que para isso tenha de a perder como minha.

Cada vez mais assim penso.

Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue

O propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir

Para a evolução da humanidade.

É a forma que em mim tomou o misticismo de nossa raça.

Fernando Pessoa

terça-feira, 24 de junho de 2008

Noite de São João

A fogueira d' "A poesia quando chega...",
iluminando a noite de Sâo João.




Noite de São João

Noite de S. João para além do muro do meu quintal.
Do lado de cá, eu sem noite de S. João.
Porque há S. João onde o festejam.
Para mim há uma sombra de luz de fogueiras na noite,
Um ruído de gargalhadas, os baques dos saltos.
E um grito casual de quem não sabe que eu existo.

Alberto Caeiro

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Metafísica de Pessoa quase leva a poesia ao ringue



Mesmo com o São João chegando, o grupo “A poesia quando chega...” não pára! Animadíssimos com o resultado do último recital, já começamos a escolher os poemas para o próximo. Todos já começaram a mergulhar na alma do Fernando Pessoa (ou seria “nas almas”, visto que ele era vários?!) . Ficamos embevecidos com a beleza e vastidão da sua obra. Cada um traz seu livro, faz pesquisas, vê o poema que combina com o outro... e embora o FP (já estamos íntimos, rs) tenha uma obra imensa, acabamos sempre nos batendo na escolha do outro. Ontem quase que a metafísica do FP levou a poesia ao ringue... isso porque teve gente querendo disputar poema, rs... No fim, salvaram-se todos, inclusive o poema. Eis o poema (des)agregador:


HÁ METAFÍSICA BASTANTE EM NÃO PENSAR EM NADA

Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

"Constituição íntima das cousas"...
"Sentido íntimo do Universo"...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.

O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.
Fernando Pessoa como Alberto Caeiro

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Hoje, 18 de junho, é a primeira inauguração (que só acontece para os amigos) da CASA POEMA Escola Lucinda de Poesia Viva. Nós, d'"A Poesia Quando Chega...", contrariando os versos de Ferreira Gullar, pedimos licença e reverenciamos o espaço que hoje se abre nesta Casa Poema!

Daqui da Bahia, cultivamos e enviamos para plantio no quintal da casa uma árvore de gratidão, entusiasmo, ousadia, compromisso, coragem, amor à poesia, encantamento e cumplicidade. A sua semente veio do Rio, no coração de Elisa e Geo. Nós, aqui, éramos terra fértil e nem sonhávamos... Mas, foi acontecer o encontro e germinou uma planta dadivosa que nos nutre e nos pede cultivo contínuo, pois cuidá-la nos torna mais vivos.

Finalizamos confirmando os subversivos versos do poeta e oferecendo-nos para, juntos, incendiar o país de poesia e com POESIA!

terça-feira, 17 de junho de 2008

Aniversário - Fernando Pessoa

Como estamos começando a estudar o poeta Fernando Pessoa para o próximo recital, segue apenas 1 das suas preciosidades, na voz de Paulo Autran.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Amores Diversos - sobre o nosso recital.



A sensualidade e a criatividade tomou conta do Espaço Castro Alves da Saraiva Mega Store no último dia 8, com o nosso Recital Amores Diversos, onde falamos de poemas de amor e erotismo, com temas desde início dos tempos a mais modernos, até mesmo por que hoje “A indecência pode ser normal, saudável...” desde que não vá para o cérebro, e se torne obscena, viciosa.

Assim, gostaríamos de agradecer a presença de todos que nos prestigiaram com a sua presença. Também é preciso agradecer à Saraiva, na pessoa de Simone que estabeleceu conosco mais que uma parceria, uma cumplicidade; à Paperball Productions, que tem nos acompanhado em nossas apresentações e ajudam a eternizá-las e a levá-las a quem não pôde vir, através da filmagem e produção primorosa dos nossos dvd’s; e também à Escola Lucinda de Poesia Viva.

O processo de criação e preparação dessa apresentação, devemos dizer, foi ao mesmo tempo sofrido, desafiador, divertido e prazeroso pra nós. Apareceu o desejo de fazermos um recital com poemas de amor e eróticos. Seguimos guiados pelo desejo e decidimos montar o recital. Na primeira fase de preparação, que é a escolha dos poemas, a gente foi se apaixonando por esse ou aquele poema. No dia seguinte, aquele poema já não dizia mais nada. Troca-se o amor de um poema pra outro. Detalhe, o outro já tem ‘dono’. Começam as negociações, as guerras. Gente com olho grande no poema do outro, gente negociando troca de poema, gente querendo desistir de poema e o grupo pressionando pra o poema ficar, ou quem vai adotar os poemas órfãos que devem permanecer no repertório, gente em crise com o vocabulário do poeta, gente se deleitando com o escolhido. Enfim, um caos: que é o início de tudo!

Escolhidos os poemas vamos para a compreensão, a busca das imagens. Falar poesia com a palavra VIVA e pulsante. O grupo junto, estudando os poetas, a época, as expressões, o contexto do texto, as palavras desconhecidas. Todo mundo se ajudando numa construção coletiva.

Depois vem a fase das leituras, da memorização e de dar... o Poema! A memorização nos põe em milhares de situações inusitadas, tem gente falando sozinha enquanto dirige, tem gente brigando na frente do espelho, tem gente imaginando o que o poeta viveu pra escrever aquilo, tem gente fazendo caras e bocas sem se dar conta de que está em lugar público, gente falando poema enquanto escova os dentes... Aí, chegam os ensaios. Essa é a fase mais desafiadora: emprestar o próprio corpo com os sentimentos e gestual, e a própria voz para dar expressão e vida a um poema, diante do olhar do outro. Sim, porque é diferente de falar sozinho, ou no espelho. O desejo e o medo de receber as observações e críticas para melhor sintonizar o dito com o que se quer dizer. Afinar o sentido (compreensão) com o sentido (emoção). Geovana, professora da Escola veio do Rio e passou a semana do recital conosco, trabalhando cada um de nós com ‘nossos’ poemas.

Enfim, há um caminho que antecede e tece o recital. E um novo caminho se inicia depois dele... Já temos uma provável data para a reapresentação desse recital: Dia 20 de julho, também na Saraiva (Salvador Shopping) e horário ainda não definido.

Nossa próxima empreitada será pelos versos de Fernando Pessoa e seus outros eus. Ele estaria completando 120 anos de nascimento hoje, 13.06. Em breve, postaremos maiores informações sobre ele e sobre o recital em sua homenagem.

Por isso aguardamos a visita de todos vocês aqui no nosso blog, mensagens pelo nosso e-mail (apoesiaquandochega@gmail.com) e, acima de tudo, com a sua presença em nossas próximas apresentações.

Para terminar, segue o link do vídeo que, por problemas técnicos, não conseguimos exibir no momento da apresentação. http://br.youtube.com/watch?v=hbBDD-IPeSY .

“A Poesia Quando Chega...”